Uma das principais formas de se avaliar o comportamento de um material sob fadiga é através das curvas de Wöhler, que correlaciona o nível de carregamento aplicado (S) com o número de ciclos (N) até a falha do material. As curvas de Wöhler são obtidas a partir de uma série de ensaios mecânicos em diferentes níveis de carregamento, permitindo, de preferência, que seja possível estabelecer matematicamente uma curva S em função de N.
Com o objetivo de analisar o concreto reforçado com fibras de aço sob fadiga, a presente equipe de pesquisa entre PUC-Rio e Furnas decidiu por adotar a geometria de ensaios mecânicos já estabelecida na norma EN14651, norma europeia para ensaios de flexão estáticos. O programa experimental envolve a pré-fissuração dos primas de concreto reforçado com fibras e, em seguida, inicia-se o ensaio de fadiga com a variação da carga máxima em função da tensão residual para uma abertura de fissuras de 0,50 mm. Os níveis de carga (S) estudados foram 70%, 80% e 90%.
A figura 1 traz a curva S-N obtida para o concreto reforçado com fibras de aço estudado nesse projeto. A curva de Wöhler traz uma análise inicial do comportamento mecânico do concreto reforçado com fibras quando submetido à fadiga. É possível perceber, que todas as amostras analisadas atingiram a ruptura quando submetidas a 70%, 80% e 90% resistência residual. Como esperado, o número de ciclos até a falha diminui à medida que o nível de carregamento diminui. Para o nível de 70%, o material fibroso atinge uma média de 105 ciclos antes de apresentar a falha. Com os resultados obtidos, é possível estabelecer matematicamente a relação S-N, mostrada na equação 1.
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A curva de Wöhler foi a primeira etapa da análise do comportamento à fadiga e guiou toda a pesquisa durante o projeto de cooperação entre PUC-Rio e Furnas. Os resultados dos ensaios de fadiga têm como principal objetivo orientar futuros dimensionamentos desse material em situações de ciclos de carregamento e descarregamento ao longo de sua vida útil.
Figura 1. Curva S-N (Wöhler) para o concreto reforçado com fibras de aço
A avaliação da falha por fadiga do concreto reforçado com fibras na escala material já possui diversas análises na literatura recente. Vários trabalhos já mostram detalhadamente o comportamento e a degradação quando o concreto reforçado com fibras é submetido à fadiga, em especial na flexão e na compressão (STEPHEN et al. (2020)). É possível dividir o comportamento à fadiga e evolução do dano em três diferentes etapas (GAO et al. (1998)): (i) início do crescimento das falhas e dos vazios dentro concreto, (ii) evolução constante e praticamente linear do crescimento da abertura de fissuras até atingir um ponto crítico, e (iii) crescimento acelerado da fissura principal até atingir a ruptura total da amostra.
Estudos mais recentes têm buscado compreender melhor o processo de falha na interface fibra/matriz durante os ciclos de fadiga com o objetivo de melhor entender o desgaste ao longo dos ciclos na escala material e desenvolver novos modelos micro mecânicos. Dessa maneira, o projeto de pesquisa em cooperação entre PUC-Rio e Furnas também envolveu análise dos diferentes modos de falha da fibra aço durante os ensaios de arrancamento na fadiga.
Os ensaios de fadiga no arrancamento são divididos em duas partes: uma primeira etapa com um ensaio estático e, em seguida, a aplicação de ciclos de carregamento e descarregamento. O pré-deslizamento das amostras foi realizada a uma taxa de 0,30 mm/min até atingir a região pouco após a carga de pico. Após o descarregamento, inicia-se o ensaio de fadiga sob uma frequência de 6 Hz com uma oscilação em forma senoidal. A carga máxima aplicada (Pupp) foi definida como 95%, 85% e 70% da força máxima de arrancamento registrada Pmáx, enquanto a carga mínima (Plow) foi definida através da razão de amplitude de 0,05 (R = Plow/Pupp = 0,05). O critério de parada dos ensaios foi ou alcançar 1.000.000 ciclos ou até que a fibra apresente um dos seus modos de falha. O arranjo experimental se encontra na figura 1.
Dois modos de falha principais são observados: arrancamento ou ruptura da fibra. No primeiro caso, a fibra apresenta um deslizamento contínuo ao longo do ensaio de fadiga até que a fibra seja completamente removida da amostra de concreto. Nesse caso, a força de arrancamento é superior a resistência da interface entre fibra e matriz, que não é capaz de manter a fibra dentro da matriz. A figura 2 traz a evolução do deslizamento durante o ensaio de fadiga no caso em que a fibra é arrancada.
Quando há a ruptura da fibra, um comportamento distinto é observado. Nesse caso, o deslizamento da fibra não é significativo e a resistência da fibra à fadiga passa a ser o principal elemento de resistência dos ciclos de carregamento e descarregamento ao longo da vida útil. A ruptura da fibra ocorre de forma frágil, sem a possibilidade de observar nenhum tipo de deslizamento antes da falha. A figura 3 mostra em detalhes a ruptura da fibra de aço durante o ensaio de fadiga.
A observação dos modos de falha ao longo do ensaio de fadiga no arrancamento permite um melhor entendimento da degradação do concreto reforçado com fibras na região da interface. Com avanço da tecnologia do concreto reforçado com fibras no Brasil e no mundo, novos modelos vêm sendo desenvolvidos para descrever o comportamento do material a partir de resultados de arrancamento, como mostrados nesse trabalho. Dessa maneira, trazer uma análise detalhada da falha na interface do material compósito cimentício sob fadiga é chave para o avanço do conhecimento nessa área.
Figura 1. Arranjo experimental do ensaio de arrancamento
Figura 2. Resultado da evolução do deslizamento da fibra ao longo do ensaio de fadiga no arrancamento
Figura 3. Detalhe da ruptura da fibra após o ensaio de fadiga.
Referências
GAO, L.; HSU, T.; fatigue of concrete under uniaxial compression cyclic loading. ACI Materials, v. 95, p. 575-581.
STEPHEN, S.; GETTU, R.; Fatigue fracture of fibre reinforced concrete in flexure. Materials and Structures, v. 53, p. 1-11, 2020
Como parte do programa experimental do projeto Aneel: PD-0394-1905/2019, estudou-se o comportamento e a degradação mecânica dos concretos de alta resistência e de ultra alto desempenho com fibras de aço submetidos à fadiga na flexão, buscando a aplicação desses materiais em torres eólicas. As amostras foram pré-fissuradas até uma abertura de fissura de 0,50 mm e, em seguida, foram submetidas a carregamentos cíclicos, em que a carga aplicada oscilava entre o limite superior de 70% da resistência residual do compósito e o limite inferior de 20% do limite superior até atingir 1.000.000 de ciclos ou 4 mm de abertura de fissura, critério de parada selecionado como fim da vida útil do material. Enquanto, a figura 1 traz uma ilustração dos ensaios mecânicos realizados, a figura 2 mostra o procedimento do ensaio de fadiga. A evolução do dano
Depois do dano localizado devido à pré-fissura, o dano acumulado controla o comportamento tensão-deformação na zona fissurada. A propagação do dano no concreto acarreta no declínio do módulo secante do concreto, podendo atingir até 30% do seu valor inicial como relatado em pesquisas anteriores. Os valores de evolução do dano podem ser usados como critério para prever a proximidade da estrutura a sua falha à fadiga.
![](http://www.fadiga.civ.puc-rio.br/wp-content/uploads/2021/11/trabalhos_dcrff_01.jpg)
Figura 1. Ensaios de flexão na fadiga para (a) o concreto auto adensável reforçado com fibras de aço e (b) concreto de ultra alto desempenho
A figura 3 ilustra a queda de rigidez do concreto de alta resistência com 40 kg/m³ de fibras de aço ao longo do ensaio de fadiga. A perda de rigidez revela um aumento na abertura de fissuras e denota uma degradação mecânica do CRF. A rigidez é usada para avaliar o índice de dano (D) na equação 1, que tem como referência a rigidez k0 e a rigidez em função do índice n/N, kn/N. A rigidez k0 está associada ao ciclo (n) igual a 400, que foi escolhida como referência para reduzir as imprecisões associadas aos primeiros ciclos do ensaio de fadiga.
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Figura 2. Procedimento do ensaio de fadiga à flexão aplicado
![](http://www.fadiga.civ.puc-rio.br/wp-content/uploads/2021/11/trabalhos_dcrff_03.jpg)
Figura 3. Realização do ensaio de fadiga no concreto de alta resistência com 40 kg/m³ de fibra de aço: (a) pré-fissuração até atingir CMOD igual a 0,50 mm e (b) ensaio de fadiga com variação entre 70% de fR,1 e 30% de fmáx.
A figura 4 traz a evolução do índice de dano, calculado a partir da equação 1, ao longo dos ciclos n/N dos ensaios de fadiga. Apesar dos valores de rigidez variarem significativamente dependendo da quantidade de fibras na seção fissurada, a evolução do índice de dano apresentou muitas semelhanças para as composições estudadas. A evolução do índice de dano é gradual até atingir por volta de 30% em n/N igual a 0,90. No caso dos concretos com 20, 40 e 60 kg/m³, o índice de dano começa a aumentar vertiginosamente até a tingir a ruptura dos compósitos. Apesar da evolução do dano ser muito semelhante para o concreto de ultra alto desempenho (CUAD), essa composição não atinge a ruptura até 1.000.000 ciclos.
Os resultados mostram-se promissores no que tange a avaliação da evolução do dano dos concretos com fibra estudados, indicando que o dano desse material apresenta uma evolução previsível até atingir por volta de 30%, que é quando a ruptura súbita é atingida. A necessidade de manutenção de estruturas de concreto com fibras sob fadiga, portanto, deve ser monitorada com o objetivo de prever o índice de dano ao longo do tempo.
A torre eólica pode ser dividida em diferentes seções em termos de dimensionamento de resistência e rigidez. Em geral, o uso de elementos pré-moldados costuma ser a principal opção dos projetistas a fim de atingir torres de pelo menos 100 m de altura. As três principais zonas de uma torre eólica padrão podem ser analisadas na figura 1.
A diminuição do peso da zona média da torre é fundamental na elaboração de soluções econômicas. Em geral, as variáveis diretamente relacionadas ao peso dos anéis de concreto armado são a densidade de armadura e a espessura da estrutura. Por outro lado, estruturas muito finas se tornam mais suscetíveis à corrosão do reforço e crescimento de fissuras pela estrutura. A figura 2 traz o detalhe dos anéis de concreto protendido.
Dessa maneira, uma solução possível para esse problema está na adição de fibras na mistura de concreto a fim de mitigar a propagação de fissuras na estrutura ao longo de sua vida útil. O projeto de pesquisa (Aneel PD-0394-1905/2019) tem, portanto, como um de seus objetivos estudar a degradação mecânica do concreto com fibras quando submetido a carregamentos cíclicos e à fadiga. A análise envolve a degradação do concreto com fibras nas escalas da fibra, material e estrutural.